Breve História do Zen-Budismo
O Zen é a essência do Budismo. Através do Zazen (meditação Zen) o Buda alcançou a Iluminação1
O Zen constitui uma linhagem do Budismo. O Budismo, historicamente, surgiu no norte da Índia, onde hoje é o Nepal. O Buda histórico, Sidarta Gautama, nasceu príncipe e rico. Desde cedo preocupou-se intensamente com o sofrimento. Queria entendê-lo e vencê-lo. Por volta dos 29 anos de idade, deixou a vida no palácio, renunciou a tudo e como monge mendicante lançou-se por completo nessa busca. Conheceu mestres, estudou, praticou mas não conseguiu elucidar o sofrimento humano. Tentou então o mais completo ascetismo. Contudo, compreendeu que a mortificação não poderia levá-lo a essa compreensão. Então, sentado sob uma árvore, após um período de profunda meditação, atingiu a realização completa, compreendeu o sofrimento, sua causa e sua extinção. |
As Quatro Nobres Verdades foram seu primeiro ensinamento:
- Toda vida no mundo está repleta de sofrimento. O nascimento, a velhice, doença e morte são sofrimentos. O fato de odiar, amar, lutar para sobreviver, desejar coisas, implica em sofrimento.
- A causa do sofrimento. Buda reconheceu três causas: avidez, ódio e ignorância. A avidez que nos faz querer e querer sempre mais nunca é satisfeita. Quando conseguimos, queremos mais, quando não conseguimos, nos frustramos. Então surge a raiva, o ódio. A raiz de tudo é a ignorância. A ignorância que cria um Eu, que sempre deseja mais. Um Eu de um lado e os Outros do outro lado. Criamos separação, erguemos um muro. Surge o medo, os inimigos, e essa separação sempre aumenta. Há também a ignorância do mundo como ele é, de não ver esses fenômenos como impermanentes.
- A extinção do sofrimento. Se os desejos, o ódio e a ignorância forem removidos, então todo sofrimento cessa.
- O Caminho. Buda ensinou que o caminho para o fim do sofrimento se resume nas três práticas: Sila (os preceitos, a ética e a conduta), Prajna (a sabedoria, conhecer o Dharma e compreendê-lo) e Dhyana, a meditação (Zazen)
"A meditação é o fio-terra do Budismo. É praticar o estado de Buda. Uma mente imóvel, que não vai nem vem, que não segue o fluxo dos pensamentos. No texto budista Dhamappadha está escrito: A mente precede a tudo, todo o ódio, desejo, ignorância surge antes na mente."
Zen-Budismo
O Budismo cresceu e espalhou-se pela Ásia, surgiram escolas e mestres. As diferentes escolas priorizaram diferentes aspectos, como os preceitos, os sutras, etc. Na China, o Budismo desenvolveu-se magnificamente. No século VI, um monge chamado Bodhidharma chega à China, encontrando um Budismo altamente erudito. Bodhidharma se opôs a esse Budismo intelectual e cheio de rituais. Passou nove anos num mosteiro praticando apenas Zazen (meditação sentada). Com Bodhidharma surgiu a escola C'han, que é a tradução chinesa para a palavra Dhyana (meditação).
No Japão a palavra C'han foi traduzida por Zen, portanto Zen nada mais é do que Dhyana. No século XIII um monge japonês, Dōgen, viaja para a China e retorna ao Japão com ensinamentos da escola Sōtō. A Associação Zen de Campinas pratica a linhagem Zen Sōtō, o Budismo japonês.
Zen Sōtō Japonês
Mestre Dōgen Zenji iniciou o Zen Sōtō japonês. Apesar de ser um pensador original e único na história da cultura oriental, recusava qualquer sugestão de que estivesse fundando uma nova corrente - ou de que sequer pertencesse a uma seita. Repudiava a denominação "Zen" e se considerava apenas budista. Na verdade, a sua filosofia é um entendimento de recuperação da essência do espírito original do ensinamento do Buda Sakyamuni e a sua vida foi uma materialização do sucesso dessa tarefa.
Nasceu em 1200 d.C. e morreu em 1253. No transcurso de sua vida, dedicou-se inteiramente ao Dharma. Ainda jovem, viajou para a China à procura de um mestre verdadeiro, que encontrou na pessoa de Tendo Nyojo. Deste, ele recebeu o reconhecimento de sua iluminação e o manto de patriarca, com a incumbência de levar a linhagem Sōtō ao Japão.
Dōgen expôs a brasa viva e fundamental do Budismo, acesa entre as cinzas das tradições e rituais que a encobriam: as discriminações que a mente racional impôs à nossa visão do mundo, nos impedem de enxergar a realidade. Para ele, não existe diferença essencial entre monges e leigos, entre o Profano e o Sagrado, entre os seres animados e os inanimados, entre Iluminação e Ilusão, entre Samsara e Nirvana, entre o indivíduo e o mundo, entre o Buda e seus discípulos, entre sutras e objetos da vida diária, entre ritual e sentimento - assim, não existe diferença entre o Ser e o Tempo, já que, neste universo de impermanência, ser é devir.
Ao desfazer a barreira entre Mundano e Sagrado, Dōgen sacralizou a vida profana. A vida comum e cotidiana pertence ao Satori - diríamos, de maneira mais apropriada, é o Satori. Assim sendo, Dōgen empresta importância igual ao ato rotineiro e o ritual solene, transformando oportunidades transcendentais de realização repetida e contínua do Dharma em instantes de reafirmação do Satori. Não existe momento da existência que não seja expressão viva da realidade da Iluminação intrínseca de todos os seres.
Na visão de Dōgen, todos os homens são intrinsecamente dotados da Natureza Búdica e da Iluminação; a eles cabe apenas descobrir tal fato. E, para isso, são fundamentais os princípios da ética budista e a meditação. Para Dōgen, ética, conhecimento e meditação são uma só coisa, os componentes da prática budista. Nenhum desses elementos tem sentido sem os demais.
O mestre Daisho disse: "Paredes, telhas e pedras são a mente do antigo Buda." Devemos estudar cuidadosamente o lugar onde existem paredes, telhas e pedras... "mente do antigo Buda" não é Kuô Buddha, que existiu há anos. Em vez disso, é vida cotidiana dos seres humanos. Nesse tipo de vida, sentamo-nos e encontramos o Buda.2
Portanto, montanhas, rios e a grande terra são todos o oceano da Natureza Búdica... Assim sendo, ver montanhas e rios é ver a Natureza Búdica. Ver a Natureza Búdica é ver o queixo de um jumento ou a boca de um cavalo.3
(1) Moriyama Roshi em entrevista à Revista Bodigaya, 1998.
2) Dōgen Zenshi; Shōbōgenzō Hotsu Mujo Shin.
(3) Dōgen Zenshi; Shōbōgenzō Busshô.